GRUPO I
Texto A
Texto A
Há no firmamento
Um frio lunar.
Um vento nevoento
Vem de ver o mar.
Quase maresia
A hora interroga,
E uma angústia fria
Indistinta voga.
Não sei o que faça,
Não sei o que penso,
O frio não passa
E o tédio é imenso.
Não tenho sentido,
Alma ou intenção...
‘Stou no meu olvido...
Dorme, coração...
|
vogar: flutuar, boiar; espalhar-se, difundir-se
olvido: esquecimento;
repouso, descanso; estado de uma coisa ou pessoa esquecida;
|
Fernando Pessoa, in Poesias, Ed. África
Apresenta, de forma bem estruturada, as tuas respostas ao questionário.
1. Faz a divisão do poema em partes lógicas e sintetiza o assunto de cada uma delas.
2. Analisa o estado de espírito do sujeito poético. Justifica com transcrições textuais.
3. Atenta nas duas últimas estrofes.
3.1. Identifica dois recursos expressivos e salienta a sua expressividade.
TEXTO B
XXVI
Às vezes, em dias de luz perfeita e exacta,
Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter,
Pergunto a mim próprio devagar
Porque sequer atribuo eu
Beleza às coisas.
Uma flor acaso tem beleza?
Tem beleza acaso um fruto?
Não: têm cor e forma
E existência apenas.
A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe
Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão.
Não significa nada.
Então porque digo eu das coisas: são belas?
4. Explica a importância da referência à luz perfeita e exacta”(v.1) para a compreensão da questão que o sujeito poético coloca a si próprio na primeira estrofe.
5. Explicita a tensão dramática vivida pelo “ eu” ao longo do texto.
Grupo II
Lê o texto seguinte.
«Alberto Caeiro é o meu mestre», afirmava Fernando Nogueira Pessoa. E apesar de os leitores do século XXI preferirem claramente o trágico engenheiro Álvaro de Campos ou o solitário urbano Bernardo Soares, a verdade é que é de Caeiro que irradia toda a heteronímia pessoana, pois ele é tudo o que Fernando Pessoa não pode ser: uno porque infinitamente múltiplo, o argonauta das sensações, o sol do universo pessoano. Faz hoje cem anos que Pessoa criou Alberto Caeiro. Tinha 26 anos.
«Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro – de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade».
Foi nesta carta a Adolfo Casais Monteiro que Pessoa descreveu o «nascimento» de Caeiro. Apesar de os estudos pessoanos terem demonstrado que a carta não diz toda a verdade sobre a criação do heterónimo, nem dos poemas, a verdade é que aquilo que nela haverá de ficção serve para que Pessoa continue o seu jogo infinito com as racionalmente definidas fronteiras do real e do irreal.
«Alberto Caeiro é o homem reconciliado com a natureza, no qual o estar e o pensar coincidem. Ele resolveu todos os dramas entre a vida e a consciência», diz o filósofo José Gil, que rejeita a ideia defendida por muitos estudiosos da «alma una» de Caeiro.
Inês Pedrosa refere que Caeiro seria a «figura da musa» para o poeta, que aliás o descreve em termos helénicos, louro como um deus grego. Segundo a cronologia feita por Pessoa, Alberto Caeiro nasceu em 16 de abril de 1889, em Lisboa. Órfão de pai e mãe, não exerceu qualquer profissão e estudou apenas até à 4.ª classe. Viveu grande parte da sua vida pobre e frágil no Ribatejo, na quinta da sua tia-avó idosa, e aí escreveu O Guardador de Rebanhos e depois O Pastor Amoroso. Voltou no final da sua curta vida para Lisboa, onde escreveu Os Poemas Inconjuntos, antes de morrer de tuberculose, em 1915.
Caeiro não é um filósofo, é um sábio para quem viver e pensar não são atos separados. Por isso, não faz sentido considerá-lo menos real do que Pessoa. E cem anos depois, apesar de não ser o poeta mais lido, Alberto Caeiro tem uma materialidade de que só quem não lê poesia se atreve a duvidar. O poeta não precisa de biografia e não precisa de um corpo com órgãos para se alojar em nós, para nos pôr a ver o mundo a partir dos seus olhos, «do seu presente intemporal igual ao das crianças e dos animais», como escreveu Octávio Paz.
Joana Emídio Marques, Diário de Notícias, 8 de março de 2014, p. 47 (adaptado)
Para responder a cada um dos itens de 1.1. a 1.5., seleciona a opção correta. Escreve, na folha de respostas, o número de cada item e a letra que identifica a opção escolhida.
1.1.A centralidade de Caeiro é representada no texto, entre outras, através da expressão
(A) «sol do universo pessoano» (linha 5).
(B) «poeta bucólico» (linha 7).
(C) «homem reconciliado com a natureza» (linha 13).
(D) «deus grego» (linha 17).
1.2. No contexto da poesia pessoana, a expressão «jogo infinito com as racionalmente definidas fronteiras
do real e do irreal» (linha 12) remete para
(A) a interpenetração da realidade e da imaginação.
(B) a separação entre a realidade e a imaginação.
(C) a infinitude das fronteiras do real.
(D) a infinitude das fronteiras do irreal.
1.3. O recurso à expressão «tudo o que Fernando Pessoa não pode ser» (linha 4) configura uma
(A) elipse.
(B) anáfora.
(C) reiteração.
(D) catáfora.
1.4. A utilização de «pois» (linha 3) e de «Por isso» (linha 22) contribui para a coesão
(A) frásica.
(B) interfrásica.
(C) temporal.
(D) lexical.
1.5. No excerto «Inês Pedrosa refere que Caeiro seria a “figura da musa” para o poeta, que aliás o descreve em termos helénicos, louro como um deus grego.» (linhas 16-17), as palavras sublinhadas são
(A) um pronome e uma conjunção, respetivamente.
(B) uma conjunção e um pronome, respetivamente.
(C) pronomes em ambos os casos.
(D) conjunções em ambos os casos.
Responde de forma correta aos itens apresentados.
2. Classifica as orações seguintes:
2.1. «que a carta não diz toda a verdade sobre a criação do heterónimo, nem dos poemas» (linha10).
2.2. «que rejeita a ideia defendida por muitos estudiosos da “alma una” de Caeiro.» (linhas 14-15).
2.3. «para que Pessoa continue o seu jogo infinito com as racionalmente definidas fronteiras do real e do irreal.»(linhas 11-12)
3. Identifica a função sintática desempenhada pelos segmentos sublinhados:
3.1. «…Pessoa continue o seu jogo infinito…» (linha 12)
3.2. «… Voltou no final da sua curta vida para Lisboa,…»(linha 20)
3.3. «…para quem viver e pensar não são atos separados…» (linha 22).
4. Coloca a forma verbal da frase «…a carta não diz toda a verdade …» nos tempos e modos seguintes:
4.1. Pretérito Imperfeito do Modo Conjuntivo;
4.2. Condicional;
4.3. Futuro do Conjuntivo.
GRUPO III
Fazendo apelo à tua experiência de leitor, explica de que modo a oposição entre pensar e sentir se manifesta na poesia de Fernando Pessoa ortónimo, referindo-te a poemas relevantes para o tema em análise.
Escreve um texto de oitenta a cento e cinquenta palavras.
FIM
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Cotação
Grupo I
1- 25 pontos (15 pontos –conteúdo+ 5 pontos-estrutura+ 5 pontos- correção linguística)
2- 20 pontos (12 pontos –conteúdo+ 4 pontos-estrutura+ 4 pontos- correção linguística)
3- 20 pontos
4- 15 pontos (9 pontos –conteúdo+ 3 pontos-estrutura+ 3 pontos- correção linguística)
5- 20 pontos
Grupo II
1- 25 pontos (5*5 pontos)
2- 15 pontos (3*5 pontos)
3- 15 pontos (3*5 pontos)
4- 15 pontos (3*5 pontos)
Grupo III
30 pontos (18 pontos- conteúdo; 7pontos- estrutura; 5 pontos - correção linguística)
Correção
Grupo I
1. 1. O poema divide-se em duas partes lógicas: na primeira parte, constituída pelas duas primeiras quadras, o sujeito poético descreve o ambiente exterior que o rodeia (caracterizado pelo firmamento, pelo frio e pelo vento), o qual se identifica com os seus sentimentos; a segunda parte é constituída pelas duas últimas estrofes e aqui exprime o seu estado de espírito que é provocado, em parte, pelo exterior. 15-12-9-6-3 +5+5
2. O estado de espírito do “eu”poético pode caracterizar-se como angustiado (“E uma angústia fria /Indistinta voga”), perdido e indefinido, ou seja, cheio de incertezas, sem esperança nem sentido (“Não sei o que faça /Não sei o o que penso”). Para além disso, sente-se cheio de tédio, visível no verso “E o tédio é imenso”, assim como incapaz de sentir (“ Não tenho sentido/Alma ou intenção”). Por fim, é de salientar que o sujeito poético caiu no esquecimento, como se pode verificar no verso “’Stou no meu olvido”. Afinal, o que ele sente é o que ele vê, como se o ambiente exterior fosse exatamente igual às suas sensações interiores. 12-9-6-3 +4+4
3. 3. Um recurso presente é a anáfora (“Não sei…./Não sei…) que salienta o estado de indefinição e incerteza do sujeito poético, realçado também pela frase negativa. Outro dos recursos presentes é a apóstrofe (“Dorme, coração”) que exprime a vontade o “eu” de não sentir, pois assim não experimentaria a angústia pela qual está a passar. 12-9-6-3 +4+4
4. 4. A referência ao facto de a luz ser “perfeita e exata” torna pertinente a questão que o sujeito poético coloca a si mesmo, porque, segundo ele, a realidade (“as coisas”) é apenas aquilo que os sentidos nos dão. Ora, se há uma luminosidade intensa, os objetos apresentam-se tão visíveis que não é necessário ver para além deles, ou seja, não é preciso imaginar, atribuindo-lhes qualidades como beleza. Dai o mal estar do sujeito poético consigo próprio, expresso nos versos “Pergunto-me a mim devagar…”. 9-7-5-3 +3+3
5. 5, O “eu” vive um conflito permanente que advém do facto de ele apenas querer apreender o real através dos sentidos (“cor”, “forma”, “existência”). Contudo, não consegue alcançar esse desejo, porque o pensamento vem perturbar essa aliança desejada com as “coisas”. 12-9-6-3 +4+4
GRUPO II
1.1.A centralidade de Caeiro é representada no texto, entre outras, através da expressão
(A) «sol do universo pessoano» (linha 5).
1.2. No contexto da poesia pessoana, a expressão «jogo infinito com as racionalmente definidas fronteiras
do real e do irreal» (linha 12) remete para
(A) a interpenetração da realidade e da imaginação.
1.3. O recurso à expressão «tudo o que Fernando Pessoa não pode ser» (linha 4) configura uma
(D) catáfora.
1.4. A utilização de «pois» (linha 3) e de «Por isso» (linha 22) contribui para a coesão
(B) interfrásica.
1.5. No excerto «Inês Pedrosa refere que Caeiro seria a “figura da musa” para o poeta, que aliás o descreve em termos helénicos, louro como um deus grego.» (linhas 16-17), as palavras sublinhadas são
(B) uma conjunção e um pronome, respetivamente.
Responde de forma correta aos itens apresentados.
2. Classifica as orações seguintes:
2.1. «que a carta não diz toda a verdade sobre a criação do heterónimo, nem dos poemas» (linha10).
Subordinada (substantiva) completiva
2.2. «que rejeita a ideia defendida por muitos estudiosos da “alma una” de Caeiro.» (linhas 14-15).
Subordinada (adjetiva) relativa explicativa
2.3. «para que Pessoa continue o seu jogo infinito com as racionalmente definidas fronteiras do real e do irreal.»(linhas 11-12)
Subordinada (adverbial) final
3.1. «…Pessoa continue o seu jogo infinito…» (linha 12) Predicativo do Sujeito
3.2. «… Voltou no final da sua curta vida para Lisboa,…»(linha 20) complemento oblíquo
3.3. «…para quem viver e pensar não são atos separados…» (linha 22). Sujeito
GRUPO III
Fazendo apelo à tua experiência de leitor, explica de que modo a oposição entre pensar e sentir se manifesta na poesia de Fernando Pessoa ortónimo, referindo-te a poemas relevantes para o tema em análise.
Escreve um texto de oitenta a cento e cinquenta palavras.
A propósito da poesia de Fernando Pessoa, podemos falar de uma conceção dinâmica da realidade, alicerçada na união dos contrários, como é o caso da oposição sentir/pensar.
De facto, a dicotomia pensar/sentir é uma constante na sua poesia, apresentando-se, frequentemente, como objeto de reflexão (por exemplo, nos poemas “Isto” ou “Autopsicografia”), já que para o poeta a racionalização das sensações (sentir) é a base da criação artística mas também é aquilo que o impede de sentir, o que o leva à frustração, pois não consegue ser feliz como o gato (“Gato que brincas na rua…”) ou a ceifeira (“canta sem razão…”), por exemplo, que se limitam a sentir e, por isso, são feliz
Em síntese (Para concluir), é através desta oposição que o poeta construiu uma poesia do “fingimento” e uma conceção da realidade que o conduziu à certeza de que ele próprio é um paradoxo
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